CNTE – Emenda Constitucional permite acúmulo de cargo de professor ou de profissional da saúde aos policiais e bombeiros militares

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O Senado Federal concluiu no dia 3.07.19 a votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC 215/2003, da Câmara dos Deputados, e PEC 141/2015, do Senado), que deu origem à Emenda Constitucional (EC) nº 101, promulgada nos seguintes termos:

Art. 42. ……………………………. ………………………………………..

§ 3º Aplica-se aos militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios o disposto no art. 37, inciso XVI, com prevalência da atividade militar. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 101, de 2019)

Em suma, a EC 101/19 permite aos militares dos estados acumularem cargos civis de professores e profissionais da saúde, devendo, para tanto, serem aprovados em concursos públicos nos termos regidos pela Constituição Federal (no caso da educação, o regramento encontra-se disposto no art. 205, V, da seguinte forma: “valorização dos profissionais da educação escolar, garantidos, na forma da lei, planos de carreira, com ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos, aos das redes públicas”. grifo nosso)

Desta forma, a EC 101/19 iguala, em parte, o direito dos militares estaduais aos das Forças Armadas, que desde 2014 podem acumular cargos públicos nas áreas da saúde. Contudo, aos militares estaduais a acumulação laboral foi estendida à área da educação. Vejamos o que diz o artigo da Constituição destinado às Forças Armadas:

Art. 142. …………………………….. …………………………………………..

VIII – aplica-se aos militares o disposto no art. 7º, incisos VIII, XII, XVII, XVIII, XIX e XXV, e no art. 37, incisos XI, XIII, XIV e XV, bem como, na forma da lei e com prevalência da atividade militar, no art. 37, inciso XVI, alínea “c”; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 77, de 2014)

Para melhor entendimento do enunciado nas duas emendas constitucionais (EC 77 e 101), transcrevemos na sequência o artigo 37, XVI da CF/1988: 
Art. 37. ……………………………….. ……………………………………………

XVI – é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos, exceto, quando houver compatibilidade de horários, observado em qualquer caso o disposto no inciso XI: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) 
a) a de dois cargos de professor; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) 
b) a de um cargo de professor com outro técnico ou científico; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) 
c) a de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 34, de 2001)

Não obstante as considerações finais desta nota, a CNTE considera o seguinte em relação à EC 101/2019: 

1. O debate sobre o acúmulo de cargos na educação não deveria servir de “moeda de troca” com os policiais e bombeiros militares em meio ao processo de votação da Reforma da Previdência (PEC 6/19). E a abrupta e inesperada inserção da PEC 141/15 na agenda de plenário do Senado, a qual dormitava desde 2015 no parlamento, não deixa margem de dúvida sobre essa interpretação.

2. O acúmulo de cargo é tema complexo e da mais alta relevância na área educacional, razão pela qual se encontrava desde 2003 em debate no Congresso, sem o devido consenso em torno da questão. Isso porque não se trata de regular apenas o regime de trabalho em sala de aula. Os profissionais da educação estão submetidos à jornada extraclasse, à formação inicial e continuada e devem estar comprometidos com a gestão democrática e com o projeto político pedagógico das escolas, questões que demandam dedicação quase que exclusiva à profissão.

3. A EC 101 trata exclusivamente do acúmulo de cargos, instituto jurídico que requer a aprovação em, no mínimo, dois concursos públicos: no caso dos policiais e bombeiros, concursos para as respectivas corporações e outro para a área da educação pública. Diferente das manifestações parlamentares emitidas por ocasião da promulgação da emenda constitucional, a prerrogativa do acúmulo de cargo não deve servir para estados e municípios substituírem professores por militares como forma de baratear a oferta escolar pública.

4. O concurso público para o magistério na educação básica requer formação profissional específica (artigos 205, V e 214 da CF/1988 combinados com os artigos 61 e 62 da Lei 9.394/96 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), e também os militares dos estados que quiserem acumular cargo no magistério público de nível básico, na qualidade de civis, terão que obter a qualificação profissional prevista na legislação.

5. Os militares estaduais que optarem por acumular cargo na educação e na saúde estarão sujeitos aos regramentos civis das profissões, ou seja, aos Planos de Carreira e Estatutos do Magistério e dos profissionais da saúde.

6. Na qualidade de eventual profissional civil da educação, os militares com duplo cargo público poderão se filiar a sindicatos da educação a fim de exercer seus direitos trabalhistas (a EC 101 cria uma dicotomia representativa para esses profissionais).

Ao mesmo tempo em que repudiamos a forma sorrateira e oportunista com que a EC 101 foi aprovada no Senado, a CNTE reitera seu compromisso em não permitir que o acúmulo de cargos para os militares estaduais na área da educação sirva de subterfúgio para substituir os atuais professores (concursados em fase de aposentadoria ou não concursados) por militares em regime de contrato temporário ou congêneres, tampouco para estimular a gestão militarizada de escolas públicas. A EC 101 trata especificamente de acúmulo de cargo militar com cargo civil nas áreas de educação e saúde, sendo que para a educação o ingresso deve ocorrer somente através de concurso público de provas e títulos e desde que atendidos os critérios da formação profissional.

Brasília, 4 de julho de 2019

Diretoria da CNTE